sábado, 8 de dezembro de 2012

ensaio vermelho

























canção tingida
encarnada boca rija
chicote ímpio
das esquerdas, de paixões
devassidões e taras
conjugar-te rubro
flameja-me escarlate.

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

oposto






















marque-me com sua tinta
avulso como se meu fosse
convulso como numa odisséia:
Ilíada

lateja perene entre meus lábios
ventre quase arredio
amado é minha ilha:
Ítaca

escolho o caminho curto
o fluxo paradoxal
de sua artéria:
ilíaca

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

o rei de olhos vesgos

























como pôde meu rei
ir sem dizer adeus

foi cedo
mais cedo que todos
sem sussurro
sem chorar

deixou-m um filho
bastardo filho

só príncipes morrem assim
e só era rei aqui

temi pelo dia que
choraria nosso fruto
e chorei

vi os olhos cinzentos
e me perguntava o motivo
não sabia que era morto também

inconsolável dor
ontem nasceu
morreu-me feto

o filho do rei de olhos vesgos

hoje tenho-os tortos
um que me olha o chão
outro que me escuta o umbigo.

sábado, 8 de setembro de 2012

























enquanto viva
cedi aos ardores da carne
e da palavra estuque
por não ser pedra

vertente desaforada
labirinto de tímpanos torpes
e clarevidência disforme
na retórica inflamada

enquanto morta
entalharam-me em cera
para que o semblante
parecesse vivo

boca torta, noite escura
sem porta, nem dentadura
só a ditadura do silêncio
nula e crua em sonhos de papel

ergueram-me sobre um andor
que aponta para o topo do porém
tiraram-me a língua como castigo
por não me calar, como convém.

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

o silêncio que precede o gozo





















sua expressão
chorosa
mal suporta
o pulsar de de teu desespero

palpita entre dois mundos confusos
tênues, obtusos,
frágeis e necessitados de si

asas pares
em vôo rasante
rumo ao infinito incerto
desagregadas e tuas

vidro
pedra
sombras

nativas ativas, vãs,
voam

domingo, 8 de julho de 2012

ontem estupramos



















a pobre e inocente poesia
que suou quase calada
nos respingos primaveris
das bandas do planalto

não se assustem!
nem foi tão a seco!
metemos-lhe o cuspe
sem carinho e a esmo
nos fartamos!

abusamos dela
literalmente
e ali cuspida,
gozada e surrada,
parecia entregue, morta

mas pasmem,
“ela não morreu!”
tal qual seu par
o velho rock in roll
aguentou firme
virou a cara
e deixou-se levar

foi pedofilia rimada
armada em
palavra, revólver
e concreto
na cidade do desperdício

hei, João!
apruma e cura-te
da ressaca moral
dos verbos ressecados
de Ferreira Gullar

avisa pro pessoal
no Salute
que a poesia jaz-viva
e tomamos dela
toda noite de quinta
com café e versos
fodidos, torrados e moídos
na hora!

sexta-feira, 8 de junho de 2012

palavras são gametas


























monstros com três tetas
chafurdando na lama
do poço de dentro

as retinas vão aos ossos
vistos de fora para o centro
mergulhados no mesmo
abismo bestial

e vivos obra e observador
são parte do jogo
pacto fraco
ou ardor franco

coabitam mundos
íntimos e difusos
absurdos e compatíveis

como preto e branco
em algum momento
convergem ao mesmo ponto
rabisco e visgo

um é o embuste
outro papel de embrulho
de olhos e letras
faz-se o não dito.